Tuesday, November 03, 2015

The Game, “The Documentary 2 & 2.5” (2015)



Jayceon “The Game” Taylor é um peso pesado do hip hop West Coast, e um dos últimos sobreviventes do Gangsta Rap. Não falo de gansgta usado como gimmick por inúmeros MCs para aumentar as vendas de álbuns. Falo de um indivíduo que foi/ é membro de um gang de Bloods (os Cedar Block Piru) em Los Angeles, onde este tipo de coisas é levado um bocadinho a sério. Falo de um indivíduo que cresceu no ghetto, com pais toxicodependentes, conheceu famílias de acolhimento desde os 8 anos, afiliação a um gang, venda de droga, a possibilidade de escapar pelo desporto, e finalmente, depois de levar 5 balas no peito, a redenção pela música. Tudo isso é sabido de cor por quem tem acompanhado a sua carreira musical. Carreira esta que começou há 10 anos atrás, com o lançamento do álbum “The Documentary”, produzido por Dr. Dre e 50 Cent. Depois de 5 milhões de vendas nos Estados Unidos apenas, o rapper de Compton tornou-se um valor seguro do som West Coast.

10 anos, 5 álbuns, muitas mixtapes e beefs mais tarde, eis que o controverso rapper está de volta, pronto a celebrar uma carreira que fez dele milionário, e ao mesmo tempo respeitado nas ruas de Los Angeles. Mas o que tem o The Game a dizer, dez anos depois da sua estreia no microfone?

Para começar, o veterano abre o álbum com o rapper  mais aclamado do hip hop  West Coast actual, Kendrick Lamar. “OnMe” é uma narrativa sobre o caminho percorrido nas ruas de West L.A., com sample de Erykah Badu a suavizar as imagens duras usadas pelos dois rappers.
 Em seguida, a intenção é deliberada de se inscrever na tradição de duas das suas maiores referências (Tupac e Notorious B.I.G) lançando um duplo álbum que ele considera um Testamento para o rap de 2015, ao mesmo título que o “All Eyez On Me” ou o “Life After Death”. E a proximidade com os seus ídolos não para por aí. Se as referências são constantes na letra e nos samples utilizados, é impossível não se sentir um arrepio ao ouvir a faixa nº 3 do primeiro disco: em “Step Up”, The Game usa um sample de “I Get Around” de Tupac e imita na perfeição o flow de Biggie. Com isto, pretende inscrever-se na mesma tradição de storytelling que os seus ilustres predecessores. Mesmo que seja a descrever os seus problemas conjugais num ping pong emocional com a mulher da sua vida que se queixa das suas ausências e traições permanentes em “Circles”, The Game cativa a nossa atenção com a mesma sinceridade que o fazia há 10 anos atrás, mas com muito mais mestria.


Um tema recorrente neste álbum (visível desde a capa, onde o azul dos Crips e o vermelho dos Bloods estão presentes em igual proporção) é o gang banging. Game continua a contar-nos as suas histórias de vida e morte nos ghettos de L.A., mas numa perspectiva mais interrogativa do que nunca. Em “Made in America”, ele canta:

“I used to wanna be Eazy
Then I realized it wasn’t that easy
I used to wish that I was 2Pac
Then I realized that might get you shot
Figured I just gonna be myself though”*

Em músicas como “GangBang Anyway”, “Magnus Carlsen” ou “FromAdam”, o rapper lamenta a morte dos seus na guerra de gangs, e apesar de não renegar o seu passado, lamenta esta violência que o habituou a lidar com funerais e perdas cedo demais.  Porém, o ponto alto desta crítica social é atingido em “The Ghetto”, em dueto com Nas e produzido pelo Will.i.am. Desde rappers assassinados a jovens negros abatidos pela polícia, à pobreza endémica nas comunidades negras na América e em vários pontos do mundo, Game e Nas revezam-se numa leitura pessimista do mundo em que vivemos, numa demonstração de virtuosismo lírico a que nos habituou o nativo de Queensbridge. E quando rimas com alguém desta estatura, tens que elevar o teu nível, senão morres. Podemos dizer que The Game se saiu mais do que bem no exercício.

Algo que pode surpreender os mais desatentos é a omnipresença de Will.i.am dos Black Eyed Peas neste álbum. Produz e canta em 3 faixas, sendo o convidado mais presente. Na verdade, o respeito e colaboração entre os dois artistas vêm de há muito tempo. Will já tinha produzido e participado num dos sons mais emblemáticos do segundo álbum de Game, “Compton”. O rapper/ produtor é nativo de Los Angeles, e assinou o seu primeiro contrato discográfico com a Ruthless, de Eazy E em 1992. É portanto normal a sua presença, sabendo o culto que Jayceon tem pelos NWA. Daí a canção “Don’t Trip” reunir Ice Cube, Dr. Dre e Will.i.am num beat minimalista à la West Coast: uma linha de baixo pesada e hipnotizante, uma bateria ligeira e 3 MCs em pleno ego trip.

The Game faz algumas alusões ao seu primeiro álbum, e ao facto de este ser uma forma de fechar um ciclo. Duas músicas (“The Documentary 2” e “LikeFather, Like Son 2”) são sequelas de músicas presentes no Documentary original. São o ponto de vista de um Jayceon mais maduro, mais experiente, mais lúcido e capaz de transmitir uma mensagem positiva aos seus fãs e aos seus filhos. E como para rematar a esquizofrenia (assumida) deste gangster narrador, o segundo disco acaba com uma ode ao seu passado(?) de drug dealer, e tem como título pouco subtil o nome do maior traficante mexicano da actualidade: “El Chapo”.

The Documentary 2 + 2.5 é um duplo álbum que, mesmo se não traz nenhuma novidade, instala mais firmemente The Game na paisagem musical. Na continuidade da tradição West Coast, rodeado de um exército de convidados, seja no microfone ou na produção, o rapper de Compton conseguiu erguer mais um marco importante no hip hop, que neste momento bem precisa deles. É notável o caminho percorrido desde o primeiro álbum. Mais versátil no seu flow, mais capaz de variar cadências e deliveries, mais propenso à introspecção e afinando a sua perícia como contador de histórias, Jayceon Taylor cospe as suas tripas neste álbum, provavelmente o melhor da sua carreira. Apesar de Dr. Dre ter voltado ao estúdio para ajudar na produção, não assumiu o controlo total como da primeira vez. E o resultado é um álbum bastante homogéneo, equilibrado, e calibrado mais para ser ouvido no carro do que no club.






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*”Costumava sonhar em ser o Eazy / Mas apercebi-me que não era tão fácil assim / Costumava desejar ser o 2Pac/ Mas percebi que podia ser alvejado por isso / Decidi que era melhor ser eu mesmo”

Tuesday, April 28, 2015

Why Hank Moody is THE MAN




"To my dear beautiful daughter,
I’m writing you a letter, that’s right a good old fashion letter it’s a lost art really, like
handjobs.
I have a confession to make: I didn’t like you very much at first. You were just this annoying little blob, you smelled nice, most of the time. But, you didn’t seem to have much interest in me, which I of course found vaguely insulting. It was just you and your mom against the world, funny how some things never change.
So I cruised along doing my thing acting the fool, not really understanding how being a parent changes you. And I don’t remember the exact moment everything changed, I just know that it did.
One minute I was impenetrable, nothing could touch me, the next my heart was somehow beating outside my chest, exposed to the elements.
Loving you has been the most profound, intense, painful experience of my life, in fact its been almost too much to bear.As your father I made a silent vow to protect you from the world, never realizing I was the one who would end up hurting you the most.When I flash forward my heart breaks, mostly because I can’t imagine you speaking to me with any sort of pride, how could you? Your father is a child in a man’s body, he cares for nothing and everything at the same time. Noble in thought, weak in action, something has to change, something has to give.
Its getting dark, too dark to see."


The man who wrote this letter to his daughter is, despite what you might think or say about him, the epitome of the man of the XXIst Century. Hank Moody, the fictional main character from the SHOWtime television show "Californication" embodies all the troubles, complex contradictions and wild fantasies of the modern day adult males in the western society.

This is a man whose life was devoted to the satisfaction of his primal and basic instincts, in total unawareness of consequences for him or others. In a world he knows is crumbling down, he said to himself: "I might as well make the best of it" and burn life by both ends, knowing that it will eventually end up in ashes for every single one of us. But amidst the chaos of his alcohol- fueled-sex-driven existence, there is this little oasis, this silent quiet peaceful space: his daughter. I wouldn't go so far as to enlarging this space to Karen, his "baby momma", because even though he seems to genuinely love her, he never ever seems to try to act according to whatever feelings he says he has for her. As for Becca, the beloved daughter, it's a different story. He is far from managing to protect her from the world (or himself, for that matter) but she is the only one who seems worthy of his efforts or signs of repentance. She represents an ideal he seems to have given up on, yet can't let go. She is what is left of his will of improvement, of his faith in his own humanity, empathy and ability to do good. His moral standards, totally distorted by his bohemian life of an artist, only try to come out right so he can limit the extent of the damage he provokes on his daughter.

But in what does all of this make Hank THE MAN, the one who represents all of us, in any way?

We live in a society that increasingly emasculates its men. The XXth Century opened the way for women to go to school, stay there as long as men, have equal opportunities at jobs, make as much money and be as free as only men used to be regarding their sexuality. I am not saying these were necessarily BAD changes, only stating the fact that it left men a little bit lost as to what was their role to be in this New World Order. The almighty penis doesn't set the tone anymore, strength has been replaced by brains for the establishment of dominant status. Not only men have to be bright, successful, passionate, wealthy, good looking, caring and sensitive, yet remain physically and emotionnally dominant, sexually satisfying and respectful of their "space" in order to have the top females of the bunch, they also have to come to terms with the fact that all that MIGHT NOT BE SUFFICIENT! After centuries of certainties, we men are simply lost, and have yet to adjust ourselves to the situation...

Facing this dilemma, Hank solved it by chosing to be all and none at the same time! He is a bright writer whose books have sold millions of copies, yet he chose to live like a bohemian artist, not caring about the status, money or any type of responsibilty that comes with fame and glory. He chose the (mild) Bukowski way, having as much sex, booze and rock and roll as he possibly can. Not that he always choses things to happen the way they do, but he takes them as they come. A young woman picks him up in a bookstore and want to have sex with her favorite author? OK. A hooker (which detail he did not know at the time) invites him up to her hotel room to snort coke on her ass? It would be ungentlemanly to decline. A random surfer girl at the supermarket steals his rock collection after he brought her home for sex? Oh well, it happens! Better luck next time...

This erratic behaviour is, in a way, one that all men dream of having. Who hasn't dreamt of having the type of freedom Hank displays one episode after another, and still have a beautiful caring wife and daughter to go home to? Even when they go hard on him for being such a hazard for himself, he gets away with witty wordplay and droopy eyes begging for forgiveness. And even after he lost the love of his life and disappointed his daughter in every way imaginable to the human mind... he still acted like he was in charge, despite his ex beig married to another man... 

Thursday, September 11, 2014

30 dias



30 dias. Daqui a 30 dias sou um homem casado. Daqui a 30 dias sou oficialmente, aos olhos de Deus e da lei dos homens, o marido de uma mulher. Linda. Doce. Sensata. Exigente. Honesta. Adalgisa. Minha. 30 dias. 30 dias, não para fazer de mim um homem, mas para começar a pôr à prova o homem que eu sou. Não começar propriamente,  na verdade é continuar. Já vivemos juntos, já partilhamos tudo, já gerimos conflitos,  fazemos planos, rimos e choramos juntos.

É só uma confirmação,  uma afirmação,  uma assinatura apenas, não muda nada, certo? ERRADO. Muda tudo. Sem mudar o fundo, muda tudo. Passamos a ser um só. Já não há tu + eu. Há nós.  Para tudo. Nada é mais difícil do que conjugar duas pessoas numa só.

Nada é mais difícil do que encontrar consenso em duas mentes, dois carácteres, duas personalidades, dois corações. Parece simples, mas não é.  Não é só juntar dois corpos sob o mesmo tecto. É juntar duas almas sob o mesmo juramento, é mantermo-nos fiéis a nós mesmos, e ao que esperamos e prometemos ao outro. É uma formalidade que existe há tempo demais para contarmos, mas cujo impacto simbólico e  emocional é muito próprio a cada um. A cada dois. Eu tenho uma mulher capaz de me suportar, de me apoiar, de me aconselhar, de me ajudar, de me ralhar, de me emendar, de me consolar, de me chamar a atenção,  de me motivar a alcançar as estrelas... de me AMAR.

Não de um amor idílico com nuvens cor-de-rosa, unicórnios e arco-íris,  e que ignore a realidade crua e nua deste mundo. Não. Um Amor, o único amor, baseado na construção de uma vida a dois, na superação de que se é capaz quando agimos por algo maior que nós próprios.  Peço todos os dias a capacidade renovada de fazer o mesmo por ela. Peço todos os dias que a rotina, os problemas, as dificuldades sejam provas que nos fortaleçam,  que cada pedra que nos é atirada sirva a edificar a nossa muralha e nos proteja de agressões futuras. Peço paciência, tolerância, bravura, rectidão,  para poder ser o farol desta família que constituirei de forma oficial daqui a 30 dias. Tudo o que eu peço,  tudo o que eu quero, é pousar a cabeça ao lado da tua, é acordar com o teu beijo, é olhar na mesma direcção que tu, é ter a tua mão para caminhar os anos que nos forem dados a viver sobre esta terra. Sei que daqui a 30 dias não vai haver um minuto para respirar, tudo vai ter de respeitar um timing absolutamente escrupuloso (que muito provavelmente não será respeitado...); então,  antes de estarmos submersos pela solenidade, antes de termos 300 pessoas de olhos fixos em nós,  antes de este magnífico caos que vivemos estes últimos meses se alinhar e fazer sentido, TODO O SENTIDO, deixa-me dizer-te, Adalgisa Borges de Sousa, o quanto te amo. Amo-te ao ponto de querer ser todos os dias melhor do que na véspera; amo-te ao ponto de querer renovar os meus votos diariamente, com gestos simples, que te façam sentir o quanto és parte de mim. Amo-te ao ponto de querer o melhor para ti, que cresças e continues a desenvolver a mulher linda, carinhosa e batalhadora que por milagre se apaixonou por mim no fim do Verão,  há quatro anos atrás. Amo a pessoa forte e frágil, tolerante e teimosa, directa e hesitante, madura e mimada, guerreira e anjo,  que me ajuda a aliviar o meu fardo diariamente. Amo a maneira como me fazes sentir. Sempre. Até quando estou de burros amarrados. Até quando penso que sei tudo, e acabas por me ensinar da maneira mais simples que o que sei hoje pode não ser válido daqui a 5 minutos.

Amar na felicidade, na facilidade, na opulência, é fácil. Amar na provação,  na dificuldade, no erro, na falta de tudo o resto, é Amar com A maiúsculo. É como já me provaste que me amas, e é como quero passar a minha vida a provar que te amo. Daqui a 30 dias. Daqui a 30 anos. Até ao meu último suspiro.

Friday, May 23, 2014

Racismo, Humanidade e Bananarama




Eu como banana e não sou macaco.
Eu acredito na teoria da Evolução e não sou macaco.
 Eu sou negro e não sou macaco.

Acho muito bem que os macacos se multipliquem, por solidariedade, para calar os racistas, por tudo e mais um par de botas. Sejam felizes, sejam macacos. Eu não sou. Só tenho pena que todos os auto-intitulados macacos, frutos da hype e do consenso mediático orquestrado por uma agência de publicidade, não tenham tido o mesmo reflexo na escola primária, quando certamente conheceram um preto que, no meio da roda, era tratado de macaco pelo grupo dominante. Se calhar alguns também cantaram, riram, humilharam... Mas hoje a internet manda ser macacos, porque carga de água não o seríamos todos? Ainda por cima é por uma boa causa! Quem não o for, ou resolver levar as coisas de maneira literal, não compreende nada da vida, é um hipster que quer ser do contra, é um frustrado que põe a sua história pessoal acima do bem fundado consenso MUNDIAL de que só há solução para o racismo na macacada. Se calhar sou isso. Sofro de muitos problemas, este é mais um, sem dúvida.


Apenas acho que não faz sentido toda a vida me afirmar como humano, renegar o macaquismo que me quiseram atribuir desde a infância, para hoje dizer: "Ufff!!!!!!!!!! Finalmente, hoje ganhámos uma batalha contra o racismo. HOJE SOMOS TODOS MACACOS! VITÓRIA!" O meu excesso de dignidade e de consciência não permite.

Peço perdão a todos os que ofendo por não entrar na sacro-santa lógica imposta pelo instagram, peço desculpa por não conseguir filosofar símicamente. Eu não sou macaco. Não consigo ser, não quero ser. Nem por uma causa, nem por um segundo. É que para mim, não é uma problemática que surge quando atiram bananas ao Daniel Alves. É um combate vivido na pele há três décadas e meia. É passear com a mãe da minha filha grávida, e um corajoso dizer, depois de estarmos separados pelas portas do metro: "vai nascer daí um lindo macaco!" É mexerem-me no cabelo desde pequeno como se fosse um animal de estimação a ser descoberto pelo proprietário, extasiado com a fofura do pelo. É dizerem-me a vida toda que falo e escrevo bem "para um preto".


É a mesma lógica que fez cientistas até ao século XX afirmarem que os negros são 3/5 de seres humanos, vá-se lá saber o que isto quer dizer. É a mesma lógica que fez com que as exposições universais até ao princípio do século XX expusessem seres humanos em jaulas, pois não eram mais do que animais exóticos. É a mesma lógica que fez com que fossem perenizadas tradições que dizem que o Africano nasceu para servir. Os filhos de Cham (ou Canaã), filho de Noé, o amaldiçoado. "Servo do Servo será de seus irmãos" (Genesis, 9:25). Teorias de eugenismo foram escritas com base nestas ideias e premissas. Para eu hoje, num acto de solidariedade espontânea e irreflectida, ceder naquilo em que acredito e me tornar um macaco COMO OS OUTROS? NÃO. Cada um combate o racismo como quer e pode. Hoje somos todos macacos, amanhã somos todos pandas (branco, preto, asiático e gordo, magnífico símbolo ecuménico!)... Eu não me consigo dissociar de quem sou. Nem sinto necessidade disso para provar o que quer que seja aos racistas. SOU HUMANO. LITERAL E FILOSOFICAMENTE. SEM CONCESSÕES.

escrito a 30 de Abril de 2014, em plena febre símica mundial. Desde então...


E para quem ainda apoia o movimento da banana, eis uma prova de que é preciso ser um macaco mediático para ser aplaudido... 

Thursday, March 20, 2014

O pós-dia do Pai

O dia do Pai para mim sempre foi um segundo dia da Mãe. Ou por outra, nem sempre. Houve um momento na minha vida em que era MESMO o dia do Pai, do meu herói, daquele cuja atenção desde cedo procurei. Lembro-me das "obras de arte" que fazia na escola primária, na semana anterior à data, e da minha emoção ao entregar o amontoado de pedras coladas e decoradas, com a minha caligrafia torta e desmazelada de criança, àquele que contribuiu por metade na minha vinda ao mundo. Mas temos os heróis que podemos, nem sempre os que queremos, e por volta dos meus 10 anos de idade, as prendas do género passaram a ter um receptor único. E o dia do Pai passou a ferida. Pus-lhe por cima o tempo, a vida, a distância, e lá fui eu, avançando em idade e em sabedoria - achava eu!- galgando o meu caminho, fingindo não pensar, não sentir, não lembrar. 

Órfão de Pai vivo. Chocante, a expressão, mas tão, tão verdadeira... A minha Mãe foi tudo, Pai e mãe ao mesmo tempo. De três. Contra todas as vicissitudes, batalhando para que não nos faltasse o material, o moral e o afectivo. Não quero diminuir o papel de toda a "aldeia" que a coadjuvou, tias sobretudo, de sangue e de coração, que foram o suporte dela nas poucas (ou muitas) vezes que lhe faltou a coragem e o ânimo para levar em frente a sua tarefa. Mas a minha Mãe foi, fez, lutou, batalhou, guerreou... Saber, eu sempre o soube; valorizar, infelizmente, demorou algum tempo. Todos os filhos são ingratos. Todos sem excepção. Por mais que tenhamos, falta sempre algo, queremos sempre mais. Mais liberdade, mais tempo, mais amor. Inconsciente! Sei hoje que o que não faltou, foi amor! Tudo o que foi feito, e o que não o foi, foi amor. Definir prioridades. Traçar o futuro. Planear. Trabalhar. Viajar. Passar pouco tempo em lazer, em brincadeira, porque mais tempo não havia. Rigor. Disciplina. Respeito. Dever. Tudo isto com um propósito dificilmente visível para os olhos de uma criança...

Passaram os anos, fiz-me homem, cometi os meus erros, aprendi a dar valor ao que tinha, depois de muito perder. E tornei-me Pai por minha vez. Meses antes, semanas antes, apesar da confiança, do amor, do apoio, veio a apreensão, a angústia. A DOR. A tal que esteve enterrada sob as areias do tempo. Mais viva do que nunca, agora alimentada pelo medo. De não estar à altura; de não ser o Pai que quero e tenho que ser; de me transformar no que mais abomino e temo nesta vida: um Pai demissionário. Teria dado jeito ter com quem conversar sobre essas questões existenciais específicas aos Pais de primeira viagem, em particular os que não tiveram ou deixaram de ter Pai; gostava que quem de direito tivesse partilhado comigo a sua própria experiência, transmitido alguma tranquilidade, alguma confiança. Não que precisasse de um Pai para aprender a ser Pai, pois isso só os filhos nos ensinam. Mas não avançar nesta nova e tão importante aventura na minha vida com tanto ressentimento se calhar teria sido menos doloroso. Pois se há coisa que o tempo não faz é curar. É o pior cicatrizante de sempre. Contenta-se de ser uma camuflagem, a aparência da melhoria. Mas quando mexes na ferida, revives a dor, intacta, como no momento do golpe. E nesses casos o tempo alia-se à memória, e permite-te esquecer TUDO O RESTO, inclusive a razão da mesma, mas nunca a dor. A filha-da-puta da dor inscreve-se no teu código genético, e tudo o que o tempo faz é entorpecê-la, nunca calá-la.

Hoje sou Pai. Há oito anos. Errei algumas vezes, e tenho a pretensão de achar que acertei outras tantas. Sobretudo percebi que, faça o que fizer, a minha história como Pai vai depender do que eu fizer como Pai; e para que funcione no melhor interesse da minha filha e dos próximos que vier a ter, tenho que deixar para trás o que vivi de negativo como filho. Mas para isso, tive que resolver a dita dor. Não ignorá-la, não fugir dela, não fingir que ela não existe. Lidar com ela. Encarar aquele que foi o bode expiatório dos meus problemas e frustrações, aquele que passou de herói a vilão, aquele de quem tanto esperei ao ponto de não esperar mais nada. Depois de anos sem o ver (desde os meus 16 anos), voltei a olhar o meu progenitor nos olhos. Aos 29 anos. A mágoa, o ressentimento, as perguntas, a dor. A dor. Tudo subiu de uma só vez. E desceu. Olhei para trás, para as nossas vidas, para os nossos desencontros. Para o meu percurso desde a "demissão" dele, para o pouco que eu sabia do dele desde então... para o resultado inexorável das suas escolhas. Se na minha vida houve um enorme vazio provocado pela ausência do meu Pai, que nem todo o zelo e dedicação da minha Mãe conseguiu cobrir, o que será que existiria neste homem que pura e simplesmente renunciou aos três filhos? Pensei na minha filha, de cuja mãe estou separado, mas que não imagino por um segundo a minha vida sem ela. Como seria possível passar 13 anos sem fazer das tripas coração para a ver, para saber dela, para a abraçar, para lhe dar o pouco que sou? Abordei este encontro com imensa raiva dele e pena de mim mesmo, e acabei por me convencer que não era eu que era digno dela. Eu tenho uma vida inteira para ser Pai, ao contrário do meu, que passou totalmente ao lado da experiência; uma vida inteira para dar aos meus filhos aquilo que a minha consciência e o meu Amor me ditarem. Não para compensar o que eu não tive, como a um momento pensei; não por mim, para mim. Por eles. Para eles. Para não sentir aquela impressão de estar diante de estranhos daqui a 20 ou 30 anos.

"Filho és, Pai serás". Esse é dos mantras mais lixados que existem. Não há melhor do que pôr-se no lugar dos outros para perceber todas as implicações dos seus actos. Concordemos ou não, se conseguirmos chegar a algum nível de compreensão, já não terá sido em vão. Filho sou. Pai sou. Apontei o dedo, muitas vezes, durante muito tempo. E só me fez mal a mim. Desde então, explodi, e aprendi a valorizar o que tenho, o que sempre tive, e a relativizar o que me faltou, porque apesar de tudo, fui e sou um privilegiado por ter a Mãe que tenho, a família que tenho, a estrutura que tenho. Não posso transmitir aos meus filhos menos do que isso.

Ontem não festejei o dia do Pai, por inúmeras razões. Porque ontem não foi dia do Pai em França, onde está a minha filha. Porque não acredito na política das palmadinhas no ombro quando ainda falta tanto para fazer.  Porque ser Pai, é todos os minutos de todas as horas de todos os dias desde o momento em que o nosso primeiro rebento veio ao mundo. Não há nada de mal  com um gesto simbólico, como as prendas que me lembro de ter feito para os meus Pais, e de ter recebido da minha filha. E que espero continuar a receber. Só ela dá um sentido a esse dia, e continuo a tentar ser o melhor Pai que posso. A minha História com a paternidade é dolorosa, está hoje ligeiramente apaziguada. Tenho que me concentrar no futuro, nos meus descendentes. Serei julgado por eles cedo ou tarde. Espero e farei tudo para o ser pelo que fiz, faço e farei, certo ou errado. Pois como disse o Theodore Roosevelt, "Num momento de decisão, a melhor coisa a fazer é a coisa certa; a segunda melhor é a coisa errada. A pior coisa que podes fazer é não fazer nada"

Friday, January 24, 2014

SNOB...



Tenho um grupo de antigos colegas da faculdade que me convidaram pra ir ao cinema no Colombo. Recusei horrorizado,  eles não perceberam o porquê. Pronto, já não são amigos. Meus, pelo menos, não.  Temos valores demasiado diferentes para tal amizade vingar (a prova que a democratização das faculdades, mesmo as mais elitistas, é o garante da perda de determinados valores que, quanto a mim, devemos perpetuar).

Para mim, cinema só se for pra ver filmes de autor no São Jorge ou na Culturgest. Compras só no triângulo Braamcamp/ Castilho/ Avenida, e restaurantes só com estrela Michelin e/ou "chef" famoso. Não vou pros copos no Bairro, isso era aos 15 anos, durante a minha crise de adolescência. Hoje aos 30 e poucos, vou a sítios que de tão confidenciais, nem eu lhes conheço o nome... mas os porteiros fazem-me vénia sempre que lá vou. 3 vezes por semana. E ao fim de semana. Enquanto outros procuram férias em conta no país, eu preciso de fazer 1000 km para me sentir suficientemente "dépaysé" (e sim, adoro um bocadinho de "french dropping", é tão chic!); se porventura devo ficar em Portugal durante um período de férias, tomo sedativos suficientes para só acordar no interior seguro da Quinta do Lago, com o motorista a abrir-me a porta do carro.  

No dia-a-dia não ando de transportes públicos, estão cheios de gente estranha; tamém não conduzo, não quero contribuir para o efeito de estufa, o planeta agradece. Desloco-me exclusivamente de taxi, aliás, de que me serviria ter um numero de cliente VIP se não lhe desse utilidade? E sejamos sinceros: no meu duplex ali mesmo a dois passos do Jardim da Estrela, ter carro seria uma dor de cabeça descomunal. Então, TAXI. Mas atenção: SÓ MERCEDES. Novos. E pretos. Totalmente. acho qualquer outra cor de mau gosto. A minha actividade profissional não me permite "fautes de goût". Sim, porque eu tenho um trabalho onde a imagem é primordial. Eu diria mesmo que é TUDO. Sim, sem exagero. Tirando ser bem parecido e discutir de ideias com os meus colegas/ amigos artistas e pensadores (os mesmos desde os bancos do colégio Valsassina, seguimo-nos até aos anos de orgia na Católica, e hoje recusámos estar à cabeça das empresas dos Papás, pois não fazemos puto de ideia do que nelas se passa) a minha actividade laboral é bastante light.

Sou um artista na alma, e as grades de um emprego convencional asfixiariam a minha criatividade. Pinto um quadro ou cago uma escultura de 4 em 4 anos, e consigo mover meio mundo e o outro para irem apreciar o meu laivo criativo, numa galeria daquelas de renome, cujos patronos são as empresas de maior renome ainda dos amigos do Papá. Como todo o artista, a minha necessidade devorante de inspiração para as minhas raríssimas peças leva-me a viajar pelo mundo inteiro, conhecer diferentes realidades e room services, ajuda-me a construir a minha "Humanidade"... O meu modelo absoluto é o Johnny Depp, por quem nutro uma secreta paixão platónica desde os 12 anos de idade. Detesto a adoração que lhe fazem os hipsters de 20 anos, que o descobriram como Pirata das Caraíbas. Coitados, não viveram o suficiente para conhecer a sua magnífica interpretação no "Eduardo-Mãos-de-Tesoura"... Passar do universo magnífico e surrealista de um Tim Burton para a mesquinhês de uma super-produção Disney é algo que só consigo perdoar a este ser humano, a nenhum outro! 

Para os meus amigos cinéfilos de centro comercial, sou um cliché ambulante, um rico arrogante e pedante. Para a maioria das pessoas, cujas vidas monótonas e vulgares se pintam num longo e entediante quadro monocromático, eu sou a luz que eles sonham ser e nunca serão.  Sou a cor que eles querem ter e nunca terão. Porque não é algo que se possa adqurir do dia para a noite, nem com muito dinheiro. Temos visto por aí que o dinheiro não compra bom gosto, que o digam os angolanos e chineses que pululam neste país com malas de dólares, prontos a disparar as suas notas em todas as Louis Vuitton desta vida para se aproximarem o mais possível da quintessência da elegância e do savoir vivre: EU. Por mais que se pintem, que mandem gravar LVs e GG em todas as malas, cintos, pratos, talheres e estofos de carro (quelle horreur!)... não nasceram, NUNCA SERÃO.

Monday, September 16, 2013

An Angolan Player in the NBA?



Morais, Carlos
Born: Oct 16, 1985
Height: 6´4” (1,95 m)
Weight: 200 lbs. (91 Kg)
Prior to NBA: Petro Atlético (Angola)
Years pro: R


Here is a player profile sheet that I would very much love to see shortly on the official website of the NBA. Carlos Morais is not the first Angolan player  to do tryouts in the NBA - not even the first time that he does so himself- but it is believed that he could become the first player to sign and play through regular season in the League.

In the opinion of many experts, he is not the first angolan with a great chance to integrate a team in the best basketball league in the world. Jean-Jacques da Conceição, notorious Angolan player in the '80s and '90s, headlining the team who first participated in the Olympics, was for years considered the best African player, outside America. What are the reasons for a player with that potential, as well as several other stars with as much potential, to  have never even approached the NBA (apart for the famous altercation with Charles Barkley in Barcelona 92)? In my opinion, the reasons are mainly the following:

The Path. Most foreign players, African in  particular, that make it into the NBA do so through American universities. Some rare come from the major European leagues, where  American scouts have gone increasingly seeking players. Now, with the exception of Carlos Morais, who had a brief stint by a U.S. high school in 2004-2005 (Community Christian School in Georgia) none of the other Angolan candidates  had the experience of an entire season in an American structure, even if at high school level. Is that in the United States, school sport is extremely well organized, supported and sponsored, as colleges and universities are the main hotbed of American sports champions. The competitive mindset, mental preparation and psychological conditioning, the "winner mentality" begins in high school, where jocks reign as champions in the arena. Although it may appear short, this experience always proves to be valuable, influencing the attitude of the player throughout his career, and especially, allowing him to understand what is expected from him during a tryout.

- Physicality. African players entering the NBA are generally tall (above 2.05 meters). Although he is two meters tall, Jean-Jacques, as all Angolans ever cited as potential candidates for the American League, was lighter than his direct rivals. In a competition where you can play back-to-back-to-back (3 games in 3 consecutive nights), the ability to withstand the physical shocks is paramount. With his six foot three and ninety kilos, Carlos Morais is a shooting guard in the Angolan championship, so his direct opponents would be players like Kobe Bryant, Dwayne Wade, Ray Allen and Joe Johnson. Without being physically very far from these players (we saw his good physical condition during AfroBasket 2013, from which he ended MVP), the biggest challenge for Carlos Morais to join the NBA, would be to maintain an even game level during the long campaign of 82 games, long coast to coast trips, etc...

- Fundamentals. Angola has had, throughout their numerous campaigns in continental, world and Olympic competitions, very few tall players, able to dominate the paint offensive or defensively. Thus, they early had to opt for the methodical execution of basketball  fundamentals: defense solidarity, ball movement, movement without the ball, handles, game vision, shooting. In short, the absence of big players made ​​the team aware of the need to act as a team ever since. In this context, the absence of a figurehead as other African teams with players already in NBA, forced them to work exhaustively all departments of the game. This has always been perhaps the greatest hindrance to Angolan players integrate the American League. Collectively they are good, to the point that there is a homogeneity that prevents ONE OF THEM from shining. However, there have always been some that cause greater impression, as Jean-Jacques, Miguel Lutonda and Kikas Gomes in their time, as today we have Carlos Morais. He has a strong fundamental basis, proved able to play as a team and thoroughly implement "the plan." Good defense, good shot (best three point shooter of the African Championship Tournament 2013  and top scorer of the Angolan championship in 2011 and 2013), good at handling the ball, he lacks only increased activity in the distribution of the game, as he might be expected to play Point Guard in the NBA.

- Motivation. What certainly made him stand out to the point of getting a second tryoutd by an NBA team, was his focus, motivation, willpower. Since the confrontation with the Dream Team 1992, the Angolan players saw the gap that separates the U.S. from the rest of the world in terms of basketball diminish considerably. Not because the NBA has become weaker, but because the rest of the world, which grew to admire, idolize and copy American players, gave a giant leap forward when it comes to basketball. Today the NBA has dozens of foreign players from Argentina, Brazil, Germany, France, the Congo, Nigeria, to name a few examples. The inferiority complex is over, and today, any confident and persevering player  can aspire to achieve this dream. Sure, he will still have to meet all requirements. Remain in perfect physical shape,  live according to the precepts of rigor and discipline, serving an exemplary life hygiene worthy of a top-level athlete who wants to continue to progress.

In short, Carlos Morais is part of a generation that has seen little or nothing of what was almost absolute domination of the U.S. in basketball; a generation that learned to play basketball with the And1 Mixtapes, who were dazzled  by Allen Iverson, Jason Williams, Vince Carter and Tracy MacGrady, whose un-academic style of play delight the fans of highlights and spectacular actions. He a combination of the two styles, rigor and showtime, show and effectiveness.
On the outcome of the tryout he was subjected by the Toronto Raptors, we know little or nothing. Only the enigmatic and promising photograph posted on his instagram, which shows what seems to be a player's contract, a card identifying him as a player  of the Toronto Raptors, and the tag: #OneStepCloser. 



Closer to his goal of playing in the best basketball league in the world, against the best players in the world. Closer to grow as a player, and live a unique experience so far for Angolan player; one we hope to see  repeated by many, many others.




"Excellence is never achieved by chance. It is always the result of high intention, sincere effort, and intelligent execution. It represents the wise choice among many alternatives - choice, not chance, determines your destiny. "- Aristotle.